sexta-feira, 17 de agosto de 2012

terça-feira, 7 de agosto de 2012

ESSÊNCIA DE MULHER

A luta pela igualdade entre sexos, no se que se refere a direitos e deveres, foi grande, dura e sangrenta, marcada, inclusivamente, pela morte de mulheres valentes, que em tempos difíceis deram a sua vida na consecução de tal ideal. Basta recordar Olympe Marie de Gouges, guilhotinada, em 1791, por pretender que a Declaração de Direitos do «homem e do cidadão» se aplicasse também às mulheres. É graças a elas que hoje existe uma igualdade, pelo menos formal, reconhecida na nossa Carta Magna (Constituição), e podemos aceder praticamente a qualquer dos trabalhos realizados pelos homens. Mas, como sonhou Sigrid Undset, feminista do início do século XX, «o movimento feminista ocupou-se apenas com os ganhos, esquecendo-se dos prejuízos da libertação». É neste árduo processo para a igualdade que as mulheres sofremos um enorme dano colateral, ao deixarmos pelo caminho algo que nos é consubstancial: a essência feminina, a feminilidade. Assumimos de forma espontânea, e sem qualquer queixa, que os modos masculinos eram justos e oportunos; que devíamos imitá-los para conseguir a igualdade; seríamos nós, e não eles, que teríamos que mudar. E assim fizemos, escondendo os nossos sentimentos e afectividades por medo de sermos alcunhadas de débeis ou brandas, tentando ser frias e competitivas, adoptando um aspecto varonil; adulterámo-nos a nós próprias, sacrificámos a nossa alma feminina a troco de sermos recebidas no universo masculino e transformámo-nos em «hombretonas», imitando os comportamentos e maneiras de vestir dos homens. Recordemos como a grande jurista Concepción Arenal, em meados do século XIX, acedeu às aulas de Direito na Universidade Complutense de Madrid com roupas de homem, para satisfazer o seu desejo e interesse por esta licenciatura. Ou como Clara Campoamor, em 1931, para conseguir o direito de sufrágio feminino, renunciou expressamente à sua condição de mulher: «Senhores deputados: eu, antes de mulher, sou cidadã». As feministas igualitárias dos anos 70, com o pensamento de Simone de Beauvoir como bandeira, e os defensores do actual feminismo «de género» (segundo o qual a feminilidade e a masculinidade são construções sociais e, em consequência, os seres humanos são neutros ou sexualmente polimorfos), conseguiram que a sociedade assuma a ideia de que trabalhar em casa, ser boa esposa e mãe, é atentatório à dignidade da mulher, algo humilhante que a degrada, a escraviza, e a impede do desenvolvimento na sua plenitude. E que, para ser uma mulher moderna, é preciso previamente libertar-se do jugo da feminilidade, em especial, a da maternidade, entendida como signo da repressão e subordinação: a tirania da procriação. Esta ideologia, que entrou com enorme força nas mais altas instâncias políticas, provocou o desprestigio e mesmo o desprezo para com as mulheres que trabalhavam nas suas casas ou cuidavam dos seus filhos, que foram estigmatizadas, considerando-as pouco atractivas ou interessantes e nada produtivas para a sociedade. Ao contrário, aquelas outras mulheres que renunciam à maternidade ou ao cuidado personalizado dos seus filhos desde os seus primeiros dias de vida aparecem, perante a opinião pública como heroínas, autênticas mulheres modernas, que “sem perderem o tempo”, na atenção aos seus filhos, se entregam plenamente à sua profissão, pela qual sacrificam tudo, o que as liberta e converte em estereótipos da emancipação feminina. Esta estereotipificação inversa, favorecida pela atitude de algumas lideres políticas, distorce a imagem e prejudica a vida familiar da maioria das mulheres “comuns”, pois favorece a organização da vida profissional, ao não considerar as mulheres como mães e entendendo que os trabalhadores não têm obrigações familiares; dificultando, assim, a mudança de mentalidade sobre a importância real da maternidade, tanto para a mulher em si, como para a instituição familiar, base inquestionável da sociedade, sem a qual nunca poderão ser adoptadas medidas verdadeiramente conciliadoras para a vida familiar e laboral. Longe do mundo idealizado pelas imagens estereotipadas de mulheres hiper-libertadas que gozam exultantes da sua elevada vida profissional, que nos transmitem os meios de comunicação, na vida real encontramo-nos actualmente com demasiadas mulheres que, apesar do seu êxito profissional, se sentem profissionalmente frustradas e insatisfeitas, cansadas de imitar os modos de actuar masculinos, amarradas a uns modelos que não lhes pertencem e que não encaixam na sua essência mais profunda. Mulheres que se esforçaram por cumprir as suas funções «exactamente como um homem», e cuja natureza, rejeitada e reprimida, reage em forma de depressão, ansiedade e infelicidade. Estas mulheres estão a alimentar o nascimento de um novo feminismo. Mulheres que demonstraram, sobejamente, que são tão capazes, como qualquer homem, de chegar ao mais alto cargo profissional com brilhantismo e eficácia, e que não querem disfarçar-se de homens, assumir os moldes masculinos, nem emular as suas atitudes e condutas; mas ser elas mesmas. Flexibilidade; imaginação, intuição, cooperação, expressividade emocional; empatia, afectividade; consenso; pragmatismo; capacidade de improvisação e visão contextual; são algumas habilidades sociais inatas da mulher – quase todas acentuadas pela maternidade – que, segundo os estadistas, serão um valor em alta, praticamente, em todos os sectores da economia do século XXI. Com estas capacidades, as mulheres já lograram uma forte presença nas ocupações e profissões de serviços e dominarão muitos destes hábitos no futuro, facilitando soluções imaginativas, bem como novas e engenhosas formas de actuação, imagináveis em muitas ocasiões para o universo masculino. Chegou o momento de reivindicar que a actividade profissional se adapte à nossa condição feminina e não o invés. O novo feminismo defende um reconhecimento social para a labor da mulher, cuja forma de ver a vida e compreender a realidade é um valor inquestionável que deverá reflectir-se numas condições laborais favoráveis específicas e, portanto, não idênticas às dos homens; com uma especial atenção à maternidade que, longe de ser opressiva, é na maioria dos casos profundamente libertadora, enriquecedora e faz da mulher um ser mais pleno. É hora pois de recuperar o perdido, de reclamar a nossa peculiar, «memória histórica», exigindo a devolução da nossa integridade feminina. Algo sem o qual nenhuma mulher pode alcançar o equilíbrio pessoal e, portanto, a felicidade, pois como afirma Allison Jolly, primatóloga de Princeton, «só compreendendo a sua verdadeira essência, a mulher poderá assumir o controle da sua vida». A mulher só alcançará a sua plena realização existencial quando se comportar com autenticidade em relação à sua condição feminina. Porque para a mulher ser mulher é tudo. E o resto só é resto.

UMA NOITE À LUZ DA VELA

Encontrei uma pessoa que me confessou que a sua família, uma vez por semana, passa uma noite à luz da vela. Tudo começou num dia em que a electricidade faltou. Nessa noite não houve televisão, nem rádio, nem computador. Pais e filhos ficaram juntos em redor de uma vela acesa. O serão foi divertidíssimo, conversou-se, contaram-se histórias e o tempo passou serenamente. A experiência agradou e, a família, a partir desse dia decidiu passar uma vez por semana, a noite à luz da vela. Actualmente, durante o dia, se retiramos o tempo de sono, as famílias dispõem pouco mais de três a quatro horas para estarem juntas. Habitualmente o (des)encontro tem início ao jantar. As refeições são feitas de televisão ligada para se ver as notícias. Este momento de partilha, por excelência, é assim desperdiçado: a televisão intromete-se, como se de um muro se tratasse. A seguir ao jantar, enquanto os mais novos se isolam no quarto a ouvir musica, a jogar no computador ou a navegar na Internet, os pais continuam hipnotizados pelo televisor, distraindo-se com a novela ou com o reality show do momento. O tempo passa e, sem darem conta, as quatro horas foram consumidas num ápice. No outro dia, a rotina repete-se. Para existir intimidade entre as pessoas é indispensável que haja partilha. É importante revelar os pequenos acontecimentos que ocorreram durante o dia. Os momentos bons, os maus, as dúvidas, os desejos, as frustrações, enfim., é preciso partilhar. De que outra forma é que nos podemos conhecer uns aos outros? Se perdermos este hábito como é que os pais podem acompanhar o que se passa com os filhos? E o casal, como é que pode ter intimidade se não existir diálogo? Nos dias de hoje não se discutem em casa os vários assuntos da actualidade; assistimos na televisão aos debates que os outros fazem por nós. As crianças têm cada vez menos espaço para a imaginação. Não brincam aos polícias e ladrões, ou aos príncipes e princesas, preferem jogar em frente a um ecrã um jogo que alguém imaginou para eles. Os adolescentes não procuram pedir aos pais opiniões e conselhos, em vez disso pesquisam na Internet. Acaba por ser mais cómodo para os pais, porque assim, pelo menos não os aborrecem com perguntas difíceis. Se reflectirmos um pouco, percebemos que vivemos numa sociedade de consumo que procura a todo o custo apoderar-se do nosso tempo livre e captar a nossa atenção, apenas com um objectivo: obrigar-nos a consumir. É assustador o número cada vez maior de horas que os adultos, jovens e até as crianças passam por dia a ver televisão e em frente ao computador. O tempo acaba por ser destinado quase em exclusividade para satisfazer necessidades narcísicas já que a outra pessoa fica excluída. Ninguém tem dúvidas que isto tem consequências na relação entre pais e filhos. Mas, a relação entre o casal também fica atingida. Muitos casamentos acabam por definhar com o tempo, por que não há comunicação. O diálogo e a partilha são indispensáveis para que haja intimidade entre as pessoas. Há coisas que têm que ser ditas. Nalguns casos o silêncio pode ser corrosivo e devastador. Um casal que atravessava uma grave crise conjugal apresentou-se ao médico para tentar fazer uma terapia de casal. Uma das queixas apresentadas pela mulher era que estava casada há trinta anos e o marido nunca lhe tinha dito, durante aquele tempo, que a amava. Por isso, ela sentia-se profundamente infeliz e insegura. O marido com alguma indiferença respondeu – Disse-lhe que a amava no dia do casamento, como não mudei de ideias, não vejo a necessidade de me repetir. Prescrição médica: «Uma noite por semana à luz da vela».